quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Aula 6 - Cultura Empreendedora

Devido às mudanças tecnológicas e sócio-econômicas verificados em escala mundial cresceu substancialmente, nas últimas décadas, a importância dos pequenos empreendimentos como gerador do desenvolvimento econômico face a sua habilidade para inovar, diversificar e criar novos empregos. Tal fenômeno coloca, perante os agentes de desenvolvimento, órgãos governamentais, universidades e institutos de treinamento, o desafio de fomentar o desenvolvimento de novos empreendimentos através da formação de uma cultura empreendedora.
Por tudo isto a educação para o empreendedorismo está se tornando um componente importante na integração dos programas acadêmicos de universidades e escolas, com nítida tendência a expansão propelida pelas forças sócio-econômicas.
Recentes pesquisas confirmam a nossa previsão: Scott e Twomey baseados em dados coletados junto a estudantes ingleses relata que 25% deles tinham em mente a idéia de iniciar um negócio e 41% aspiravam por tornar-se patrão de si próprio. Cifras reveladas nas pesquisas de Harrison & Hart mostram que 47% dos estudantes irlandeses expressavam o desejo de gerenciar seu próprio empreendimento. Sandholtz revela que 45% dos 1.000 estudantes de pós-graduação em Administração de Empresas da Universidade de Pittsburg desejavam ser empreendedores. Welsh pesquisando 2.000 estudantes descobriu que 82% expressaram interesse em cursar uma das disciplinas relacionadas com empreendedorismo.
Durante os últimos seis anos temos feito similar levantamento junto aos estudantes de Administração Mercadológica das minhas classes na Universidade Católica (UCSAL) e observamos que enquanto nas primeiras contagem apenas 10% revelaram ter intenção de iniciar seu próprio negócio, seis anos depois (1998) este percentual eleva-se a 48% !
Por outro lado, a demanda por ocupações vinculadas ao auto-emprego ou empreendimento próprio está refletida no crescente número de universidades que iniciaram novas disciplinas ou programas relacionados com empreendedorismo, tais como centenas delas no exterior e algumas no Brasil, notadamente : USP, UFSC, UFPe, UNB.
A criação de empregos e oportunidades de trabalho através do empreendedorismo está atual e mundialmente bastante pesquisada e documentada. Líderes regionais e governamentais sentem-se obrigados a estimular a criação de novos empreendimentos. Tanto inovações como a criação de postos de trabalho implica no desenvolvimento de algum tipo de organização para operar o conjunto das atividades de várias pessoas em busca de um objetivo a ser realizado, pois, as inovações tecnológicas não tem serventia até que alguém as explora organizadamente. Historicamente o realizador é aquele que toma a inovação e cria a equipe para aproveita-la socialmente.
As implicações desta realidade em um mundo de rápida descontinuidade afeta as tradicionais políticas administrativas das organizações. Para elas sobreviverem e progredirem haverá necessidade de novas competências administrativas semeadas de empreendedorismo. Recentemente visitamos a USF (Universidade São Francisco) em Bragança Paulista e verificamos o planejamento para a transição da organização burocrática envelhecida para uma organização moderna, em busca dos "entrepreneurs", de modo a aproveitar o empreendedorismo latente na maioria dos seus docentes.
Visualizamos o emergir de uma economia baseada em pequenos e médios negócios o que nos leva a realçar a necessidade de preparar e educar potenciais empreendedores para que identifiquem oportunidades, equipando-os com os conhecimentos e as habilidades necessárias ao gerenciamento destas oportunidades com redução dos riscos e da probabilidade de fracasso. Neste contexto, as universidades tem um papel a desempenhar e uma oportunidade para empreender.


EMPREENDEDORISMO PODE SER ENSINADO ?

Esta indagação tem sido fundamental. Um levantamento feito por Vesper entre professores das 15 melhores universidades americanas, revela que 93% dos respondentes concordam com a possibilidade de empreendedorismo ser ensinado. Em outro estudo Fleming indicou que a educação aumenta a conscientização dos estudantes sobre empreendedorismo e por isso facilita o desenvolvimento das ações empreendedoras.
Todavia a grande questão - a nível mundial - é saber se o atual sistema educacional promove a formação da cultura empreendedora?
Um grande número de educadores reconhecem que o atual sistema de ensino põe muita ênfase na aquisição de conhecimento e pouco enfoque é dado no desenvolvimento de habilidades específicas para o uso prático desses conhecimentos.
A maioria reconhece que a metodologia instrucional atualmente dominante não enfoca o desenvolvimento da cultura empresarial. Os estudos de McMullan e Long sugerem que na educação para o empreendedorismo os estudantes deveriam lidar com a ambigüidade e exercer a prática de definir problemas e projetar soluções .
Eles mostram que - nos atuais cursos de Administração de Empresas que ensinam as funções Marketing, Financeira e Pessoal como se elas fossem aplicáveis de modo igual nos diferentes estágios e dimensões de um empreendimento - uma nova estrutura se faz necessária. Como os maiores problemas empresariais ocorrem nos primeiros estágios do empreendimento parece-nos óbvio que a educação para o empreendedorismo não seja ensinado por funções departamentais e sim por estágios de desenvolvimento do negócio.
No Centro para Estudos do Empreendedorismo do Babson College (EE.UU.) - núcleo pioneiro de respeitada instituição de ensino e pesquisas relacionados com o tema - as diretrizes educacionais desafiam os estudantes a se comportarem tanto como generalistas como especialistas para serem desenvolvedores e solucionadores de problemas em oposição a sonhadores. As diretrizes enfocam o raciocínio conceitual todavia, seguido da implementação prática e real. Em termos de ensino de gerenciamento de oportunidades de negócios nada é mais refinado e desafiador do que o esta metodologia educacional.
Não obstante, a educação para o empreendedorismo não deve ser confundida com a educação para gerenciar pequenos negócios. Em recente reunião com dois avaliadores da Comissão de Especialistas de Administração que visitaram uma universidade constatamos a crítica destes feita a um colega docente por enaltecer o empreendedorismo e convocar palestrantes dirigentes de órgãos públicos para debates com os alunos quando - segundo os visitantes – os palestrantes convocados deveriam ser empresários e não políticos.
Refutamos as críticas lembrando que o empreendedorismo não se confunde com empresariabilidade. A cultura empreendedora poderá existir em organizações estatais, ONGs ou universidades sem fins lucrativos. Aliás, outros especialistas, também do MEC, em recente seminário sobre as novas diretrizes ocorrido em Marilia (São Paulo), interpretava as novas diretrizes, sugerindo que os coordenadores de cursos universitários fossem menos gestores de recursos e mais gestores de oportunidades.
O principal objetivo da educação para gerenciar pequenas empresas é ensinar técnicas gerenciais simples e aplicáveis ao pequeno negócio enquanto que a educação para o empreendedorismo visa estimular a cultura empreendedora desenvolvendo a sensibilidade individual ou organizacional (coletiva) para a percepção de oportunidades (tanto externas quanto intra-organizacionais), ensinando o empreender responsável mediante a assunção de riscos pre-mensurados e aceitáveis.
Embora os dois enfoques devam ser praticados nos cursos universitários o educador precisará de um novo modelo aplicável na educação para o empreendedorismo. Tendo em vista que o empreendedorismo é um processo econômico altamente criativo, permanecem dúvidas de que as tradicionais formas de educação possam - isoladamente - resolver tal problema educacional.
Como integrar a ênfase em ordem, racionalidade e previsibilidade (existente nas técnicas de administração ensinadas na universidade) com a abordagem mais carismática do aluno genuinamente empreendedor, sem prejudicar este potencial?
Tendo ajudado a fundar a primeira escola de administração de empresas da Bahia (UFBA, 1960) lembro-me que prevalecia - e ainda hoje prevalece em muitas novas escolas – um elevado grau de controle na sala de aula e uma dependência na autoridade do professor e na sua validação como especialista.
Em contraste, numa posição de empreendedor o indivíduo deve desenvolver um novo estilo de aprender no qual profundos aspectos do seu próprio ser, emoções crenças e valores estão influenciando o processos do aprendizado. Neste sentido Gibb sugere que seja tentado uma nova praxis pedagógica , encorajando os estudantes a buscar movas maneiras de ajuste ao mundo real, como exemplificado a seguir:
·         aprender fazendo;
·         Encontrar e explorar conceitos mais amplos relacionando-os com um problema a partir de um ponte de vista multidisciplinar;
·         "Ler" o ambiente em sua volta, a pensar por ele mesmo, ficando mais independente de fontes externas de informação inclusive do professor;
·         Usar a própria sensibilidade, atitudes e valores desconectados das informações pre-estruturadas o que significará maior aprendizado com base na experiência;
·         Propiciar mais oportunidades para a montagem de redes de contatos ou parceiros no mundo prático e real;
·         Desenvolver respostas emocionais quando defrontado com situações conflitivas encorajando-os a decidir e comprometer-se com as ações a executar sob condições de estresse e incertezas.

Propõe-se, finalmente, que as escolas de administração e negócios desloquem sua prática para um foco com maior empreendedorismo, como está sumariado na tabela a seguir:

FOCO TRADICIONAL NAS ESCOLAS DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS
FOCO NA EDUCAÇÃO PARA O EMPREENDEDORISMO
Julgamento crítico após análise de um grande volume de informações
Decisão por sensibilidade intuitiva feita com informações limitadas
Compreender e invocar a informação por si própria
Compreender os valores dos que transmitem e filtram as informações
Assumir as metas até o fim
Reconhecer a grande variedade de metas dos outros
Busca (impessoal) para verificar a verdade absoluta estudando as informações
Decisões baseadas em julgamentos de confiança e na competência das pessoas
Compreensão dos princípios básicos da sociedade num sentido metafísico
Busca ajustar-se, na prática, aos princípios da sociedade
Busca da resposta correta com tempo para faze-lo
Desenvolve a solução mais apropriada sob pressão de tempo
Aprendizado na sala de aula
Aprende fazendo e fora da sala de aula
Vislumbra informações oriundas de especialistas e fontes com autoridade
Vislumbra informações pessoalmente prospectadas de qualquer fonte, ponderando seu valor
Avaliação através de instrumentos escritos
Avaliação por julgamento de pessoas e eventos via "retrocomunicação direta"
Sucesso no aprendizado medida pelos testes de conhecimento
Sucesso no aprendizado medido ao resolver problemas e na experiência do fracasso
Por outro lado, a qualidade do ensino deverá estar relacionada com as necessidades individuais de cada estudante, isto é, o modelo requer educação individualizada para cada aluno. Será necessário prospectar, previamente, o estilo de aprender de cada aluno
Este é um outro grande desafio para todos educadores do empreendedorismo

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